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Gerir num mundo de incertezas: como antecipar o desconhecido

Trabalhar em cenários de disrupção sistêmica é uma das especialidades do futurista Roger Spitz. Em um artigo para a MIT Technology Review, ele explora como a imprevisibilidade afeta a economia, a sociedade e as práticas de previsão, destacando a importância de uma abordagem adaptativa.

Pontos-chave (Key Insights):

  • A Disrupção Sistêmica e sua Imprevisibilidade: A complexidade do mundo atual torna a previsão cada vez mais difícil. A imprevisibilidade se torna a norma em vez da exceção.
  • Metadisrupções e a Nova Realidade das Tendências: As metadisrupções resultam de interações dinâmicas e imprevisíveis entre diversos fatores e trazem uma nova perspectiva sobre as mudanças que afetam o mundo.
  • Preparação Através da Prospectiva: A prospectiva permite a exploração de múltiplos cenários possíveis, fundamentando a tomada de decisões de curto prazo.

A previsão de cenários imprevisíveis

A pandemia de Covid-19, as crises energéticas e a instabilidade nas cadeias de suprimentos são exemplos de disrupções sistêmicas que geram um nível sem precedentes de imprevisibilidade. O mundo moderno tem de se confrontar com eventos isolados com capacidade para desencadear ondas de mudanças que impactam setores inteiros. Como se refere nesta análise da MIT, “um único evento, ou uma combinação de mudanças interseccionais, pode transformar o panorama econômico global, afetando o destino de setores inteiros, empresas, profissões e nações”.

A complexidade do ambiente global exige uma reavaliação de como compreendemos e lidamos com essas disrupções, uma vez que a incerteza está se tornando a nova norma. As disrupções sistêmicas não são apenas desafios isolados; elas se entrelaçam e criam um cenário onde as tendências anteriores podem não ser mais aplicáveis.

Tradicionalmente, as tendências e megatendências foram consideradas como indicadores do futuro. No entanto, a emergência de metadisrupções muda essa narrativa. O termo metadisrupção, introduzido pelo autor, refere-se a “uma família multidimensional de disrupções sistêmicas que causam efeitos generalizados e autoperpetuadores, modificando a própria noção de disrupção. As metadisrupções são caracterizadas pelas interações dinâmicas de fatores subordinados de mudança”.

Roger Spitz é um futurólogo, consultor de grandes empresas e um superprevisor, que ajuda os decisores a se prepararem para o desconhecido. Ele propõe, neste artigo, que adotemos uma abordagem mais adaptativa perante essa tarefa tão desafiadora. Em vez de confiar em suposições históricas, as organizações devem estar preparadas para identificar rapidamente as questões emergentes e ajustar suas estratégias.

Esta análise recorre a um estudo do Good Judgment Project (GJP), segundo o qual algumas pessoas (os “superprevisores” – como o próprio autor) “são extremamente hábeis na atribuição de probabilidades a resultados possíveis, porque assumem perspectivas diferentes, conciliam argumentos conflitantes e revisam suas crenças”. No entanto, diz Spitz, os superprevisores são mais eficazes em acontecimentos com alguma incerteza, e menos seguros quando “os resultados possíveis são numerosos e impossíveis de saber”.

A incerteza impede a previsibilidade

A dificuldade do prognóstico está relacionada com a complexidade do mundo e a incerteza dos eventos futuros. Na verdade, é diferente responder a uma pergunta com base em probabilidade, como se a Coreia do Norte lançará um novo míssil multiestágio no próximo ano, do que responder a perguntas sobre possíveis estados futuros em ambientes profundamente incertos.

Como se vê no quadro seguinte, uma das principais diferenças entre previsão e prospetiva é o número de cenários que cada um tem de enfrentar, e a forma como o pode fazer.

O artigo publicado pelo MIT Technology Review cita alguns outros exemplos de eventos sobre os quais temos uma incerteza profunda: quais as consequências de um colapso da internet? Quais os impactos de desastres naturais inesperados? Quando começará a comercialização do espaço? Quais são os impactos dos avanços na genômica e na longevidade? E, o mais difícil de todos, a “cascata de impactos”, em que vários acontecimentos disruptivos acontecem em simultâneo e se cruzam ou combinam.

As previsões baseadas apenas em dados não são mais suficientes. E a força preditiva da IA não ajuda, uma vez que é baseada em situações “relativamente estáveis”. Pelas suas características, acrescenta o autor, “em ambientes profundamente incertos, a causalidade só pode ser avaliada retrospectivamente, as relações são imprevisíveis, e os elementos móveis são interdependentes”.

Diante da incerteza profunda, a prospectiva se destaca como uma ferramenta vital, principalmente porque “o futuro não está mapeado, e não se pode confiar na modelagem de incertezas para gerar certeza”. Ao invés de buscar uma única previsão, essa abordagem foca na exploração de múltiplos cenários e na preparação para uma variedade de resultados possíveis. “Perguntamos por quê?, por que não?, e se?”, porque a natureza dos eventos futuros é desconhecida e suas probabilidades são incalculáveis.

Mas, ao contrário do que se possa pensar, a prospectiva não é apenas uma forma de antecipar problemas, mas sim um método para cultivar a resiliência. Ela capacita líderes e organizações a se prepararem para desafios imprevistos, permitindo uma tomada de decisão mais informada e ágil.

Dessa forma, uma prospectiva “é preparação, não previsão”. A construção de cenários preparatórios permite enfrentar de forma mais fácil o que não é simples de prever: “à medida que avaliamos as oportunidades e os riscos dos nossos cenários, examinamos minuciosamente as suas potenciais consequências. Assim, conseguimos construir resiliência para sustentar até mesmo os resultados mais críticos”, sublinha Spitz.

Como conclui o autor, ao compreender que o futuro não é linear e que novas realidades podem surgir a qualquer momento, indivíduos e organizações podem construir bases mais sólidas para enfrentar o desconhecido. A velocidade da mudança não pode ser acompanhada pelos métodos tradicionais, baseados em dados históricos, e assumindo que o passado se repete da mesma forma no mundo atual.

Para ler o artigo original, clique aqui.